terça-feira, 5 de fevereiro de 2013

Construindo uma Alaia da década de 30

Já houveram rituais complexos para construir uma prancha alaia, desde o corte da arvore até o shape  da pranchona. Nos EUA da década de 30 e 40 a coisa mudou, os processos industriais e a busca por inovação estavam consolidadas, e as pranchas passaram a ser construídas no método moderno, com diferentes madeiras, colas e acabamento em verniz ou resina epoxy. Sendo assim, com ajuda do amigo, guru e mestre marceneiro Murilão, nos metemos a fazer uma alaia inspirada nas ancients boards da costa oeste da norte americana. 

Tela de Ganadu Vincenzo_HangTen.
As pranchas alaia da década de 30 passaram a ser feitas de madeiras leves, como a balsa, associadas a outras mais duras e resistentes, como a vermelha (redwood). Na época houve um salto tecnológico com as colas e resinas a prova d'água. Com estas tecnicas, as pranchas passaram a ser mais leves que as originais havaianas. Não costuma-se usar parafusos, pois a maresia é infalível em estragá-los, além disso a madeira expande e se contrai de maneira diferente dos metais. A técnica é colar usando pedaços de madeira chamados cavilha. Madeiras mais leves geralmente são porosas, então não adianta colocar apenas cera ou óleo para impermeabilizar, resina epoxy pode ser a melhor solução.

Projeto de uma prancha da década de 1930.
Tudo começa com o projeto, de preferência com papel e lápis, determinando o tamanho, o modelo e medidas da prancha. Desenhar é fundamental, trata-se da concepção. A princípio, a internet pode ajudar muito, com dicas e inspiração para o shape. 

Madeiras caixeta e cedrinho. Atento para não usar madeiras protegidas. 

Depois vem a escolha da madeira, que vai determinar o peso, a flutuação e o acabamento que vai dar à prancha. Minha escolha, entre as madeiras que encontrei disponível na rua do Gasômetro em São Paulo, foi a caixeta e o cedrinho. O cara da loja me disse ser madeira de boa procedência, mas depois descobri que a caixeta é protegida e costuma ser de extraída de forma ilegal. Não é uma prancha que vai acabar com as matas brasileiras, mas sou da opinião de que, se não podemos evitar o desmatamento, não deveriamos gastar nem um centavo com este mercado clandestino... Paciência, vamos aprendendo.
Existem madeiras boas para construção de alaia, entre as brasileiras existe o cedro rosa, mas o que tem se usado é a paulonia, que por não ser  brasileira é a melhor opção para nossas florestas.

Marcar as tábuas é sempre bom...

A melhor maneira de cortar a madeira é usando um molde com as medidas certas, preferencialmente desenhado e preparada anteriormente (não foi o caso desta). Feito os riscos, vem a hora da serra tico-tico, ferramenta fundamental do projeto. 

O peixão tá nascendo... Shape básico.
Feito o corte no formato certo da prancha, começam os detalhes. Para ganhar flutuação, decidi dar uma ajudinha à natureza, usando uma furadeira e uma grosa (outra peça importante) começa um trabalho de deixar a tábua central oca. As pranchas antigas usavam balsa, mas hoje esta madeira é caríssima e rara. Para certos tipos de limitações usamos a imaginação.

Técnica para deixar a tábua oca e ganhar flutuação.

Feito os truques e encaixada as cavilhas, entra o momento de montar o conjunto. Esta é a hora para  últimos acertos antes de receber a cola. Na rabeta optamos por colocar uma peça de cedrinho para dar segurança, enquanto no bico colocamos duas cavilhas em 45º, segurando melhor o bico e dando um efeito de dois olhos.  

Duas perspectivas do conjunto desmontado antes de receber a cola. Detalhe das cavilhas.
A cola utilizada foi uma a base de ureia (se não me engano) à venda em lojas de marcenaria, semelhante as usadas nos compensados navais. Depois fui descobrir que o próprio epoxy que dará o acabamento final, recebe um catalizador especial que funciona como cola, ainda melhor para uso naval. Para colar será necessário alguns "sagentos" (mais uma ferramenta para a lista), mas se não tiver, existem outras técnicas, em ultimo caso, cordas ou cordilhas garantem que o conjunto cole fortemente.

Futura prancha alaia, colando com ajuda dos sargentos.
Após a colagem das tábuas vem a hora do acabamento fino, primeiramente com a grosa, depois a plaina, a lixadeira e por fim as lixas manuais. Um excelente exercício físico e de concentração. 

Plaina em ação.
A última etapa é o banho de resina, ou melhor dizendo o glass. Primeiro compra-se a resina epoxy, catalizador e o tecido de fibra de vidro. Se você mora em São Paulo eu indico a Avipol (tel. 5072 2945, diga que é o cara do Madeira & Água que indicou, quem sabe eu ganho desconto da próxima vez!). Faça a mistura (50 ml de catalizador para cada 100 ml de resina) e espalhe na prancha com uma espátula, deixando a madeira absorver bem; 10 minutos depois aplique novamente uma quantidade menor de resina e coloque o tecido por cima (ajuda muito se já tiver cortado no tamanho da prancha). Espere até o outro dia, passe uma lixa de metal (granulação 60 ou 80) tirando os excessos de tecido e resina e aplique outra camada de resina. faça o mesmo do outro lado. No final, as vezes, é necessário uma ultima pincelada de resina para cobrir pequenas imperfeições. Veja o efeito do glass depois de pronto:
Inauguração, assim como as embarcações, quebramos uma garrafa para dar sorte à nova alaia.
A fase da resina precisa de paciência, uma lixadeira elétrica ajuda muito. As primeiras mãos de lixa use granulações grossas (40, 60, 80), as ultimas devem ser de uma granulação bem fina (180, 200, ou mais), depois uma boa polida com cera automotiva e pronto. 

Moeda da Costa Rica usada como copinho para prender lash.
Antes do ultimo banho de resina ainda fizemos um furo e colocamos uma moeda para segurar a cordinha do lash. A resolução da foto está péssima, mas o resultado ficou ótimo, além de trazer boa sorte e muitas lembranças da Costa Rica. Pura vida e muito surf! 

Visão da rabeta e a parte de baixo com a moeda e a cordinha.
A estréia da prancha foi crítica, em Maresias, no dia 29 de dezembro de 2012, swell dos grandes, quase me afoguei... Surfar uma com alaia exige muito empenho, além de estar em dia com o surf e encontrar boas condições. A prancha tem muito menos flutuação, e sem quilha fica muito mais difícil fazer a linha da onda e pegar velocidade, mas depois que se aprende é como descer uma onda pela primeira vez... Dias depois consegui um surf bom com a alaia em outra praia do litoral norte de São Paulo. Ultimamente ela vai comigo e fica esperando no carro. Se o mar diminui ou fica naquela condição ideal, a tábua entra em ação.


Eu e o Mestre Murilo, trabalhando até mais tarde...

Comentários
9 Comentários

9 comentários:

  1. Parabéns pela iniciativa. Eu e mais um parceiro estamos construindo uma dessas pranchas (plank) também. Qual foi o tamanho que vocês deram para essa prancha?

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  2. quanto custou faz
    er essa alaia............

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  3. brothers??? Super democrático. Varias dicas, fotos, fiquei amarradão.. parabéns pela iniciativa de revelar esses "segredos" vou tentar fzer a minha..aloha!!!!

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  4. Parabens, muito bonita. Pessoal gostaria de fazer uma dessas, tem como mandar algum esquema e dar uma ajuda.

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  5. Com que cola foi unida as peças???? Abraços...

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    1. Usei uma cola de ureia-formol conhecida como cascamite. Mas depois descobri que a própria resina epoxy recebendo um catalizador diferente do usado para fazer o glass, funciona melhor. Se morar em São Paulo eu posso te passar um bom fornecedor. Abraço.

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  6. Obrigada pela informação... Eu moro em cabo Frio, RJ... abraços...

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  7. Boa tarde. Preciso de algumas dicas. Meu contato: 13 99670-5222 grato Luiz

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