quinta-feira, 14 de novembro de 2013

De repente, não mais que de repente em Dogtown


Stacy Peralta fotografado por Glen E. Friedman nos anos 70.

De repente das areias fez-se asfalto
Maresia e vento brando o gás carbônico
E das marés fez-se o transito
E das ondas oceânicas fez-se declives

De repente da quilha fez-se a roda
Que da alegria se fez de novo
E da emoção vento no rosto
E do vertical o que era sal

De repente não mais que de repente
Fez-se urbano o esporte mítico
E o substituto se fez autentico

Fez-se próximo o mar saudoso
Fez-se a cidade um mundo lúdico

Quando o surf concebe o skate
E longe da praia nasce o street
De repente não mais que de repente




OBS: minhas palavras livremente inspiradas no Soneto da Separação do Vinícios de Morares. 


quarta-feira, 6 de novembro de 2013

Manifesto pelas garotas do surf

Imagem: Tyler Warren

Nem tudo no universo do surfe é um mar azul ou expressão da liberdade, existe também um lado obscuro, com ambições capitais e conservadorismo machista. Neste sentido, quero levantar a bandeira das mulheres no surf e os percalços do machismo dentro e fora d’água. Pois vamos aos pontos: 


1. Equilíbrio _ Segura esta: em Genesis, livro sagrado Hebraico e Cristão, Deus descreve a vida como a união entre macho e fêmea, nada diferente das crenças orientais do Yin & Yang que falam de equilíbrio e complementariedade. Mas não estou aqui para falar de religião, muito menos de baboseiras insultem a opção sexual das pessoas. O fato é que o ambiente excessivamente masculino traz desequilíbrios dentro e fora da água, visíveis em muitos pontos que vou falar em seguida.

Photo: Jim Russi
2. Muito além do sexo _ O mainstream do surfe não entendeu nada do que ensinaram os inventores deste esporte. Tudo fica muito evidente no marketing que vem sensualizando as atletas do surf profissional feminino. Vale notar que existe uma associação entre surf e sensualidade muito mais antiga do que se imagina, sem maldade ou questão de gênero, parte reminiscente da cultura tribal, libertária, dos tempos em que homens e mulheres agiam conforme suas vontades, mediados pelas tradições e mitos polinésios[1]. Nesta visão essencial do surfe, mulher e homem são autônomos, a sensualidade é apenas um dos muitos aspectos de ambos os sexos. No entanto, hoje a mulher ainda é encarada, na praia ou no mar, como parte da paisagem, pouco valorizada pelo o que pensa ou faz, relegadas ao consumo masculino, complementar ao surfe. Quando surfistas profissionais precisam surfar muito e ainda serem modelos de beleza, me pergunto: what’a hell? Convenhamos, já temos provas muito mais que suficientes de que as mulheres são tão boas quanto (ou melhores que) qualquer homem. Tita Tavares, Maya Gabeira, Linda Benson, Lisa Andersen, Jody Coopers, Stephany Gilmore, Clarissa Moore e tantas outras vem mostrando há séculos que elas são lindas, inspiradoras, mas principalmente talentosas, calando a boca de qualquer machista de plantão, de formas que só elas sabem fazer.

3. Consumidoras e não produto de consumo _ As revistas de surfe cometem esta gafe histórica, demonstrando como este é um mundo voltado aos homens. Mulheres não são incluídas nas pautas como atletas e nem são respeitadas como consumidoras, ao invés disto são relegadas às sessões dedicadas às beldades da praia, em biquininhos e ângulos que só nós homens apreciamos. Que as mulheres são lindíssimas e adoramos contempla-las: computado, mas convenhamos, o mercado dominado por homens não está nem aí para o que elas pensam, gostam ou querem. As garotas deveriam no mínimo ser respeitadas como consumidoras. Meus amigos, caso queiram satisfazer uma mulher, parem de falar de si e experimente ouvi-las!

Photo: Grant
4. Evolução do esporte e novos rumos _ Voltamos para a água. As manobras do surfe tem tido evoluções em precedentes, muito devido à melhoria dos equipamentos, mas principalmente a criatividade e preparo dos surfistas. Batidas, rasgadas, aéreos cada vez mais altos, tubos intermináveis e ondas gigantescas, muita coragem, ousadia, força e testosterona. O surfe contemporâneo é fantástico, mas para onde vamos? Qual a próxima fronteira? Arte, estilo, leveza, sensibilidade, inteligência, enfim, o olhar feminino ao esporte não compete com o masculino, mas completa e melhora. As mulheres são cobradas por surfar como homens, mas precisam de autonomia. Lembrem-se, surf não é só força, mas dança, balanço, ritmo e improvisação.


5. Respeito mútuo e o espírito aloha _ Como me cansa o crowd e a falta de respeito! Seja entre surfistas de pranchinhas, ou body board, longboard, Stand Up ou kite surf, o desrespeito as normas de convivência do esporte são constantes, principalmente no Brasil ou em mares com grupos de brasileiros. Ondas existem em quantidade interminável, são presentes de Netuno sem dono, mas todo mundo quer pegar mais ondas que o resto, nós parecemos àquela criança mimada que rouba a tigela de pipoca na festinha para não dividir com os colegas. Quando estou no mar, as ondas disputando no grito e penso: gostaria que a mãe deste moleque tivesse aqui. Sim, uma senhorina, sentada num pranchão faz muita falta! Alguém tem que ensinar respeito, acalmar a ansiedade, equilibrar a testosterona. A presença feminina pode ser a resposta da nossa avareza, o complemento à coragem e força masculina, o espírito aloha havaiano, de compaixão e camaradagem camaradagem.


GIRLS POWER!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!

As mulheres surfistas são insurgentes, para os machos de plantão podem funcionar como uma verdadeira praga dos antigos polinésios, questionando nossa visão deturpada, de soberanos, donos das ondas, do mercado, dos lugares. Garotas, por favor, tomem seu espaço no mar, devolvam-nos a harmonia que tomamos da natureza, derrubem este império de machos mimados que criamos, em parte, para impressioná-las. 



[1] Esta visão da cultura nativa polinésia é muito semelhante a dos portugueses e espanhóis que colonizaram as Américas Central e do Sul, caso tenham curiosidade, sugiro pesquisarem o livro do Sergio Buarque de Holanda: “Visões do Paraíso”.