segunda-feira, 15 de junho de 2015

O localismo do surf e as antigas guerras havaianas

Outro dia, entrando no mar com minha prancha, quieto, voltando de uma onda ouço aquele papo entre um grupo de locais; "quem remar na mesma onda que eu vai sair talhado pela minha quilha". O recado era destinado para mim, que tive prioridade na ultima onda. Isto me levou a pensar sobre os limites do localismo... 




Nada justifica nos nossos dias qualquer atitude covarde de localismo no mar, onde um grupo tenta obter vantagens com ameaças e violência. Mas esta história é muito antiga no esporte.

Lendo livros sobre a cultura havaiana me deparo com imagens diferentes daquela que imaginamos de um paraíso do Pacifico. Isto porque o surf era uma atividade de lazer, mas ia muito além, dependendo da ocasião poderia ser um momento de exibicionismo entre amigos, ou flerte entre homens e mulheres, poderia ser uma brincadeira alegre e divertida, um jogo em que duas ou mais pessoas disputavam a mesma onda e o vencedor finalizava a onda sem ser engolido pelo quebra-coco. Em outros momentos no entanto, refletia a violência e agressividade das guerras que aconteciam no arquipélago. 

O sistema social havaiano era rígido, com regras, rituais, disputas e guerras. O interessante é perceber como o surf possuía uma relação íntima com a política, a religião e outros aspectos cotidianos da vida. Por exemplo, haviam diversas tribos espalhadas pelas ilhas, cada qual com seus chefes, considerados os parentes mais próximos dos deuses e donos legítimos do território, como senhores feudais. Neste contexto, os spots de onda podiam ser disputados como parte do território, e eram defendidos com todo afinco. Isto porque, grandes chefes dominavam outras ilhas e  guerreavam por novos domínios e estes aspectos eram reproduzidos no mar.

Quando um forasteiro chegava para surfar ondas alheias, mesmo havendo uma boa relação entre as tribos, devia usar de toda diplomacia e respeito. Caso não fossem seguidas as regras e rituais, e o forasteiro ou os locais agissem com violência ou falta de respeito, aquilo podia dar início a uma guerra sangrenta. 

Voltando hoje ao localismo, não vejo muita diferença do que acontecia, exceto pelo fato que não vivermos mais em tribos. Ou pensando bem, nem isso nos diferencia. 

A regra de respeito e diplomacia ainda permanecem e são essenciais. Dito e anotado isto, de resto, sinceramente, acredito que as ondas não tem dono, ou se tem, pertencem a vida marinha e não às pessoas.Fora isto, toda guerra, dentro do mar ou na areia é pura perda de tempo, ainda mais quando o swell apresenta condições tão boas como daquele dia... 

segunda-feira, 1 de junho de 2015

Quem foi Duke Kahanamoku?

Duke foi um surfista que germinou a semente do esporte e do estilo de vida havaiano mundo afora, adaptando um esporte primitivo a uma áurea moderna. 



 Nascido em Honolulu em 1890, colecionou conquistas ao longo dos seus 78 anos de vida, transformando-se em referência no universo dos esportes aquáticos. Este puro sangue havaiano fez parte da geração que reinventou o surf ancestral, com a honrosa missão disseminar o esporte pelo mundo. Duke estava entre os membros do Outrigger Canoe and Surfboard Club, a primeira agremiação de surfistas, quando ainda cursava a escola. No entanto, ele e outros amigos consideravam este clube restrito e dominada pelos haoles estrangeiros. Em 1911, inaugurou o Hui Nalu, ou Clube das Ondas, para incentivar o surf entre nativos. Começava uma carreira como atleta e uma missão pessoal de divulgar o surf pelo mundo. Podemos dizer que foi muito bem sucedido.




Em 1912, Duke era um surfista e nadador conhecido localmente. O Havaí acabava de se tornar território norte-americano e o esporte era a ponte entre culturas tão distantes de um mesmo país. Naquele ano, o jovem nativo foi selecionado pela primeira vez para as Olimpíadas em Estocolmo, ganhando uma medalha de ouro e outra de prata. Podemos dizer que este foi o primeiro contato do grande público com o surf. Os jornais da época contavam a curiosa história sobre o havaiano que havia ganhado medalhas olímpicas para os EUA, e seus métodos exótico de treino, domando as violentas ondas do arquipélago polinésio. Ao longo de mais de duas décadas ganhou medalhas olímpicas e bateu tantos recordes que seria muito extenso a descrição de todos eles. 

No mesmo ano que ganhou a primeira Olimpíada começou a missão de cultivar a semente do surfe. Duke dedicou-se décadas ao surfe e aos esportes tradicionais havaianos, transformando aspectos da sua cultura, parte da civilização ocidental moderna.

Na década de 1920, quando se aposentava das competições, começa a atuar em filmes de Hollywood entre 1925 e 1967, atuando como personagens nativos ou como lenda viva do surf. Muito além das tradições, Duke também era adepto das inovações, e durante a década de 1930 passou a colaborar com Tom Blake, desenvolvendo shapes e as aprimorando as pranchas de surf e paddle boards, além de auxiliar na restauração de pranchas ancestrais.

Entre 1934 e 1960 foi eleito sheriff do condado de Honolulu, uma espécie de juiz local. Na década de 1940 lança uma das primeiras marcas de roupas de surf, com as típicas estampas havaianas.

Em 1965 foi criado o Duke Kahanamoku Invitational Surfing Championship, seleto campeonato realizado na lendária praia de em Sunset Beach no North Shore.

Enfim, não foi por um acaso que Duke Kahanamoku ganhou o título de pai do surf moderno, sendo o primeiro nativo que conseguiu se inserir no contexto do mundo contemporâneo, demonstrando com sucesso o valor da cultura ancestral polinésia. Morreu em 1968, consagrando-se como um dos grandes heróis havaianos e maior a referência do esporte no mundo moderno.